CAP. 02: BRÁS, BEXIGA E BOM RETIRO

Princesa Isabel

Pouco mais de 18 anos após a chegada de Caetano Tozzi e de outras dezenas de milhares de imigrantes italianos ao porto de Santos/SP, a Princesa Isabel decretou, com a assinatura da Lei Áurea, a libertação de todos os escravos ainda mantidos em cativeiro por seus senhores em território nacional. A partir de então, não apenas os sexagenários ou os filhos dos cativos estariam livres da opressão e dos castigos, mas sim todo e qualquer homem ou mulher que ainda pertencessem ao seu dono. Durante séculos tratados como mercadorias, enfim os negros brasileiros tornavam-se cidadãos – pelo menos teoricamente.

Poderíamos, aqui, transcorrer pelo período pós-abolição e todos os problemas e percalços que dele fizeram parte. Mas, como o objetivo, agora, é falarmos sobre o Palestra Itália, atemo-nos, pois, ao clube que, todavia, ainda estava um pouco longe de nascer.

Mas o fato é que, com a inexistência de escravos, foram incentivadas ainda mais as imigrações para o Brasil. Os donos das terras precisavam de mão-de-obra capaz, pela força e pelo jeito, de cuidar das plantações de café, cana-de-açúcar, algodão e todos os produtos primários que a agricultura brasileira então produzia. Isso originou muitas outras viagens para o navio Colombo, que cruzou os mares diversas vezes. A cada chegada ao litoral paulista, uma nova multidão de gente falando uma língua até parecida com a nossa, mas bem mais difícil de entender.

Vincenzo Ragognetti

Por causa do clima, bem mais frio, e das próprias fazendas, quase todos os italianos subiam a Serra do Mar em direção a São Paulo/SP. Isso mesmo: acredite, mas no fim do século XIX e começo do século XX ainda existiam vastas extensões de terra na capital paulista e em seus arredores! Aos poucos, Caetano Tozzi foi vendo aumentar a presença de patrícios pelas ruas da Cidade e, como sempre acontece, eles foram se achegando, se conhecendo, passaram a morar em bairros próximos e, gradativa porém constantemente, passaram a “italianizar” a Pauliceia, então ainda longe de se tornar desvairada.

A industrialização de São Paulo começou a ganhar força maior no início do século passado e, com isso, muitos operários de origem italiana trocaram os campos pelas fábricas. Assim, bairros operários passaram a ser formados ou, então, a ser povoados por esses italianos. Três deles se caracterizaram por receber um número bem grande de “oriundis”: o Bom Retiro, o Bexiga e o Brás. Neste, mais especificamente, residiam três jovens muito alegres, como aliás muito alegres eram quase todos os seus conterrâneos. Luigi Cervo, Emanuelle Marzo e Vincenzo Ragognetti (que nas fotos aparecem já maduros) chamavam a atenção pela jovialidade e, também, pelo agito que imprimiam ao cotidiano de todos.

Luigi Marzo

O futebol, pelos italianos e seus descendentes chamado de “calcio”, já era um esporte bastante apreciado por aqui. Trazido por Charles Miller em 1898, teve seu primeiro campeonato, o Paulista, disputado em 1902. Mas demorou algum tempo para que os imigrantes descobrissem a modalidade e seus encantos. Naquela época, eles procuravam ocupar o único dia de descanso que tinham, o domingo, com a missa pela manhã e, aqueles cujo orçamento permitia, os saraus e os espetáculos líricos no Teatro São José à tarde e ao começo da noite. Depois, com as músicas e boas doses de vinho tinto na cabeça, pegavam o bonde de volta ao Brás, ao Bexiga e ao Bom Retiro, cantarolando as canções e ditando as regras do som numa São Paulo então ainda silenciosa e envolta em fina e constante garoa.

Luigi Cervo

Cervo, Ragognetti e Marzo eram alguns dos que se encaixavam na descrição acima. Mas, com os hormônios da juventude à flor da pele, queriam emoção, queriam adrenalina, muito embora esta palavra e seus significados, tanto o concreto quanto o abstrato, fossem então totalmente desconhecidos. Apaixonados pelo futebol, sonhavam em formar um time. Mas, como? Eram jovens, inexperientes, não tinham dinheiro. Seria necessário acontecer algo que lhes desse um empurrão, que se tornasse a mola propulsora a acionar o sonho que tinham em comum.

No próximo capítulo de “Nossa História”, você vai comprovar que os sonhos, muitas vezes, se concretizam. 

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