Treinador que mais vezes assumiu o Palmeiras deixou o plano físico nesta quinta-feira
O telefone tocou numa gelada noite de segunda-feira, em 2005. Do outro lado da linha, o jornalista Lucas Neto, um irmão que fiz em minha carreira, foi taxativo:
_ Se enrola num cobertor e vem até a Papa Genovese. O Mário Travaglini quer falar com você.
Sem entender bem o que o ex-treinador queria, fui até a pizzaria onde, na época, Luquinha comandava seu programa de rádio em todas as noites de segunda, e do qual o ex-treinador era um dos comentaristas. Logo que cheguei, e antes mesmo de saborear o primeiro pedaço, ele me falou.
_ Olha, eu tenho um sonho: quero que um jornalista escreva a minha biografia. Mas não apenas uma biografia. Quero que minha história seja contada de forma romanceada. Vou ser sincero: pensei no Lucas Neto, mas ele me disse que você é o cara certo pra isso. Então, diz aí: qual é o seu preço?
Travaglini era assim: direto, sucinto, cristalino. Já o tom, como sempre, doce, educado, gentil.
Foram, ao todo, 19 entrevistas, todas realizadas nas tardes de quintas-feiras em uma agência de automóveis na Rua Barão de Limeira. Nelas, pude conhecer em detalhes não apenas a carreira profissional, mas também a vida desta personalidade do futebol (por sinal o treinador que, ao assumir o comando do time principal do Verdão em oito oportunidades, tornou-se o líder dentre todos os técnicos palmeirenses neste quesito).
Técnico palmeirense… Sim, Travaglini torcia pelo Verdão desde quando nascera, na Rua Júlio Coutinho, 99, bairro do Bom Retiro, em 30 de abril de 1932. O profissionalismo que adotou durante toda a sua trajetória, porém, o impedia de assumir o coração palmeirense. Tanto que, como sabia das minhas preferências, uma das recomendações que me fez foi quanto ao título de sua biografia.
_ Trevisan, fica esperto: não quero nada de verde, Verdão, etc. Fui um profissional de muitos clubes, e cada um deles tem um lugar guardado no meu coração.
Assim ele me pediu, e assim surgiu o livro “Mário Travaglini: da Academia à Democracia”, uma clara alusão ao seu começo no Palmeiras e ao sucesso que fez em nosso maior rival. Na noite do seu lançamento, na sede da Federação Paulista de Futebol, inúmeras personalidades do mundo da bola compareceram, e o brilho nos olhos do treinador só não era maior do que o orgulho que o autor do livro sentia naquele momento.
Hoje, porém, meu amigo partiu, sereno como sempre foi durante seus mais de 81 anos. Mas, assim como eu, ele não acreditava na morte, e uma das provas disso foi a dedicatória que escreveu em sua biografia: “Ao mestre Oswaldo Brandão, com quem tanta amizade tive. E ainda tenho”, disse ele, anos após o inesquecível treinador ter feito sua viagem final.
Muito obrigado, Mário. Vá com Deus. Um dia, tenho absoluta certeza, a gente vai se encontrar de novo, e tomara que eu possa escrever as biografias de todas as suas vidas.
22/02/2014 at 18:21
Muito bonita sua homenagem ao Professor Travaglini, que diga-se de passagem começou no Clube Atlético Ypiranga na qual sou sócio e tem tambem muita história.
Saudoso Travaglini o precursor dos esquemas táticos, que Deus o receba de braços abertos pois voce merece.
Abs.
22/02/2014 at 18:46
Obrigado, Alfano.
Forte abraço.
21/02/2014 at 19:14
Sabe o que me deixa desanimado com a mídia em geral, é a ignorância, total desconhecimento da história do futebol brasileiro, a pobreza geral que toma conta da imprensa esportiva brasileira. Marcio,você contou uma bonita história sobre a biografia do Mario Travaglini inclusive revelando ele ser palmeirense, o que mais vezes foi chamado para dirigir o Palmeiras, o técnico que fez parte da academia. Mas a mídia teima em coloca-lo como o técnico da democracia do outro time, e nada da referencia ao Palmeiras. Me lembro muito bem quando a morte do Osvaldo Brandão, que também além de palmeirense foi multi-campeão com nosso manto, o técnico que mais vezes dirigiu o Palmeiras. E o outro time e sua imprensa insuportável colocou a bandeira deles no caixão, e foi dado como técnico do sccp. É lamentável a ânsia de associarem sobre tudo o que acontece ao time do lado de lá. Parabéns Marcio, por sua homenagem, com importantes esclarecimentos. O Palmeiras continua fazendo história, pena que poucos ainda as contem.
21/02/2014 at 19:25
Olá, Marcos.
Obrigado por suas palavras.
Travaglini é mais lembrado pela Democracia Corintiana porque ela aconteceu há menos tempo que a Academia Palmeirense.
Abraços.
21/02/2014 at 0:52
Olá Márcio.
Bom dia.
Queria deixar registrado aqui uma passagem em minhas memórias sobre o Mário Travaglini e o que ele representava para o Palmeiras em tempos idos:
Corria o ano de 1967 e logo no início do Paulistão daquele ano, com a dispensa do Aymoré Moreira, que havia recentemente trazido o Robertão para nós, ao me ver acabrunhado na empresa em que eu trabalhava, um colega me disse: “Não se preocupe, Roberval, o TRAVAGLINI vai trazer o BI para nós”. Ele se referia ao Bi do Paulista, pois o Verdão era o Campeão Paulista na oportunidade (1966). O Bi não veio, porém, essa frase ficou para sempre marcada em minhas memórias.
Em tempo: Lucas Neto, filho do saudoso jornalista Flávio Iazzetti, palestrino da velha geração e que foi um dos responsáveis, juntamente com o Planet Buarque e o Paulo Machado de Carvalho, pela formação do time que conquistou a primeira Copa do Mundo pelo Brasil, em 1958, na Suécia.
Um abraço
Roberval